segunda-feira, 29 de março de 2010

Dentição negra

Queria ser negro. Ter aquela cor maravilhosa que os negros tem, um marrom escuro que deixa a pele com a aparência de maciez. Queria ser negro e ter dentes perfeitos e ter um pinto grande. Sim, estou tendo crises dentárias e de pinto pequeno.
Primeiro fui tirar o siso, no consultório, o doutor me pede para escolher entre levar injeção, contra dor e outras coisas mais, na bunda ou no braço. Óbvio que escolhi na bunda, podia doer mais, pois eu não tenho bunda, mas pelo menos eu não veria a agulha. Depois disso, ele me dá bilhões de injeções na gengiva, eram as anestesias. Que dia infeliz da minha vida, eu, menino belonofóbico (que tem fobia de agulhas), estava cercado de picadas eternas.
Depois foi a odontologia. Hoje fui ao consultório do meu ex-dentista, que acabou virando meu dentista de novo, afinal precisarei repor o aparelho. Chego lá e percebo que os dentistas estão cada vez mais impessoais. O doutor me pede para eu vestir um óculos de proteção laranja, que pensei que era uma espécie de óculos escuro e eu não sofreria com as luzes do teto da sala, mas não demorei muito pra perceber que com o tal óculos, ele não conseguia ver minhas expressões de dor. Depois de muito gemer e reclamar, ele me põe um pano preto em cima de mim, daqueles que aparecem em filmes e seriados de médico usados em cirurgia. Pronto, estava eu, debaixo de um óculos laranja e de um pano preto, fazendo caretas de dor à toa. E não foi só a dor que me deixou com caretas, foi o barulho. Aquele barulho classico da pedra pomes girando e tocando no dente, a primeira coisa que pensamos quando pensamos em dentista, acabou se mostrando soft core. Nunca tinha percebido, mas o tal do ultrasom é muito pior, ultrasom é hard core. Aquela agulhinha (mais uma vez agulha) girando a sei lá quantos mil rpm tocando os meus dentes, criando o som mais agudo que já ouvi na vida. O som agudo da pedra pomes sai dos dentes, vai para fora da boca, dá a volta no rosto e finalmente chega nos ouvidos. O som agudíssimo do ultrasom entra nos dentes, entra na cabeça oca e toca direto nos timpanos. Um som claro e limpo e agudo e insuportável. E aquela agulha girando na minha gengiva.

E na vida seguinte, quero nascer preto, só pra não usar aparelho.