quarta-feira, 26 de novembro de 2008

Te conto uma mentira

O doutor estava a caminho de casa, o trabalho fora estressante e a única coisa que ele esperava era deitar-se na cama. Ele era um desses sujeitos que não suportava trabalhar aos domingos, pois já lhe bastava os outros cansativos dias.
Eram quase 17h quando uma uma pedra atingiu o seu vidro. Um garoto magrelo havia jogado um pedaço de tijolo no carro.
- Porra seu moleque, você está louco? O que você tem na cabeça, seu merda? - A raiva do doutor era tão grande que bastava um suspiro para ele surrar a criança.
- Desc-desculpe senhor, - disse o menino, olhando para assustado para baixo - tentei parar outros carros, esse foi o único jeito que consegui fazer algum parar. O meu irmão caiu da cadeira de rodas e está machucado, não consigo lenvantá-lo do chão.
 
O médico sabia o que fazer, enfiaria aquela arrogância na morte próxima, num castigo de Deus, em algum lugar que ele não gostava nem de imaginar. Por que será que somos tão cruéis? E a tristeza tomou conta daquele senhor estressado. Será que fora o estresse? Será que é um sinal? Pararei de trabalhar aos domingos!
O doutor não disse nada, pois a vergonha era tanta, juntou o menino mais velho que apenas ralára os joelhos, daí sim pediu desculpas:
- Meus pequenos, sinto muito, é o estresse. Sou médico, levo vocês ao hospital, só para fazer um curativo nesse arranhão.
 
As crianças já estavam gratas com a ajuda que ele dera, não precisavam de mais. Talvez precisassem de um pirulito e um abraço. Assim deu o doutor, sem nem saber que era disso que elas precisavam.
Ele entrou no carro, esqueceu dos cacos de vidro, voltou pra casa. Que tristeza a dele.
 
Ser escritor me fez despreocupado em definições: conto ou fato? Contos são mentiras, são criações ideológicas da mente; fatos, verdades, um passado que aconteceu. Portanto nota-se que acabou a preocupação perante: é mentira ou é verdade? Só me restou um senso crítico: o texto é bom? Se é bom, acredito cegamente, se não for, não acredito, mesmo que seja a mais pura verdade.
Ser escritor sugou a minha capacidade de discernir certo de errado, justo de injusto, verdade de mentira. Pouco me vale, importa-me o texto.
 
(Ser escritor, leitor, é escrever. Não é porque sou escritor que eu escrevo bem, apenas escrevo.)