domingo, 9 de novembro de 2008

Ilusão

Nascer, crescer, fazer dinheiro, casar, fazer filhos, fazer mais dinheiro, aposentar-se, fim.
Depois que meu filho único foi embora, quando ele fez 21 anos, comecei a me achar meio velho. Crise boba de meia idade. Digo que era bobo, pois de velho eu não tinha nada. Era assim, trabalhar e aproveitar.
Pode parecer meio cruel ao dizer isto, mas como foi bom quando ficamos sozinhos de novo, como no início do casamento. Assim fomos, eu e o meu amor, apenas, até ela adoecer, e falecer. Foi quando ela se foi que a crise deixou de ser crise, eu de fato fiquei velho.
Não só velho, como solitário. O que eu faria do meu dia? Eramos nós dois, sempre unidos, brincando como crianças, como se a infantilidade ressurgisse todos os dias. Mas ela partiu, e meus dias não eram mais infantis, eram velhos. Dias velhos são aqueles dias de inverno, frios, chuvosos, mórbidos.

Foi em 96, dois anos após o falecimento da minha amada, que meu filho me visitou em um fim de semana aleatório. Ele costumava me visitar nos feriados, nas férias. Como era bom ver meu garoto de novo! Mas em 96 as coisas foram diferentes. Era um domingo qualquer, ele apareceu na minha porta, com um buquê de flores maravilhoso.
- Meu filho, como é bom te ver! Aconteceu alguma coisa? - Fiquei preocupado, ele viajara 12h para me ver, será que não teria acontecido algum imprevisto?
- Foi saudades, meu pai, só saudades. Queria lhe ver. As meninas não puderam vir, ficariam muito cansadas e teriam de faltar aula amanhã. - Por um momento fiquei triste, queria tanto ver as minhas duas pequenas netinhas, tão belas, tão doces. Passou essa dor em um abraço gostoso que o meu menino me deu.

Fiz o prato preferido dele para o almoço, jogamos conversa fora, buscamos lembranças da vida de menino dele, depois da minha vida de menino.
Nada me fez mais vivo que aquele domingo.
Na realidade, a vivacidade surgiu aí. Como era bom viver, agora eu tinha um motivo. Meu pequeno passou a me visitar todos os domingos, acho que notou que eu sofria arduamente de solidão.

Foram 4 meses de deliciosas tardes domingueiras. Nada era mais vantajoso do que trocar o Faustão pelo meu garoto. Mas um domingo ele não veio, eu esperava-o com aquele mesmo amoço de sempre.
Talvez ele estivesse cansado, ocupado, deixei-o cuidar da vida. Seria fácil aguentar outra semana tediosa para vê-lo.
E a semana passou, mas ele não apareceu de novo, daí fiquei preocupado.

Por mais que não gostasse, eu liguei pra ele.
- Meu filho, que saudade!
- Pois é pai, tempos que não nos falamos, ando ocupadíssimo!
- Ah, está explicado o porquê de não vir me visitar nos ultimos dois domingos, não é mesmo?
- Como assim, ultimos domingos?
- É, fiquei lhe esperando.
- Mas, por que?
- Porque eu já presumia que você viria.
- Como presumiu?
- Me acostumei com as suas visitas semanais, portanto achei que viria.
- Mas que visitas? Fazem quase 6 meses que não o vejo!
- Não? ... Tudo... bem...

Agora fazia sentido, como nós comemos tanto e mesmo assim sobrava almoço?
Como as flores que ele trazia nunca estavam nos vasos no dia seguinte?
Como nós não cansávamos das mesmas, exatamente as mesmas, conversas?

Como a solidão me degradou tanto?