sexta-feira, 2 de abril de 2010

Velhice

Cinco horas da manhã e eu só conseguia pensar na minha velha sozinha no hospital. É verdade que a filha e o filho estavam lá, também é verdade que quem está sozinho sou eu. Se bem que eu tenho esse cachorro. Meu cachorro. Meu filho. Meu verdadeiro e amado filho. Vocês tinham que ver, hoje tinha um monte de lama na rua, eu disse que se ele se sujasse, eu ia dar uma surra nele. Ele foi correndo direto em direção a lama. Eu pensei que era um safado, mas ele desviou da lama e saiu correndo. Ele adora correr. Corre tanto que volta para casa com a linguinha de fora, afobado. Eu tinha alguém. Ela não, ela estava sempre dormindo. Mas que bom que dormia, pois daí ela melhorava. Minha velha só precisava descansar. A minha filha fica chorando, dizendo que a velhinha vai morrer. O outro diz que a culpa de ela estar doente é minha, pois ela está com os pulmões devastados pela fumaça do meu cigarro. Mas não é culpa minha. É culpa do médico que disse para eu voltar a fumar. Hoje eu fumo uns quatro cigarros por dia, mas é só para o remédio de dormir funcionar. Sem o cigarro, eu fico que nem um zumbi pela casa, drogado e andando por aí, sem nem lembrar de nada no dia seguinte. Minha velha não vai morrer, ela é forte. Ela é mais forte que eu. Eu sou meio fraco, meio surdo, meio cego. Ela é forte. Ela não vai morrer. Ela vai estar aqui quando o estádio estiver pronto, pois ela adorava ir assistir jogos de futebol no estádio. Ela vai assistir o Paraná jogar aqui comigo, da janela de casa. Ela é forte. Eu sei disso.